Os movimentos sociais
dos anos 70-80 legaram à sociedade brasileira como experiência inédita e de
fundamental importância à constituição de uma sociedade verdadeiramente
democrática.
O objetivo dessa
abordagem é menos contrariar algumas análises que nos parecem depreciativas e
equivocadas dos movimentos e mais realçar a importância daquilo que os
movimentos nos deixaram para o enfrentamento dos problemas que nos traz a
globalização econômica, de modelo neoliberal, entre os quais, o problema do
desemprego e o da exclusão social. Como se sabe, a urgência no tratamento dessa
questão tende a facilitar ações apressadas, imediatistas e certamente
paliativas.
De fato, foi como o surgimento de uma nova sociedade, uma
sociedade que, em face dos constrangimentos à vida social e política impostos
pelo regime militar, soube criar novos espaços de interlocução públicos,
revelando uma capacidade política da qual se tinham dúvidas e mostrando-se portadora
de princípios e valores democráticos.
A diminuição do número de movimentos nos anos 90 não deve
ser tomada como indicador de debilidade. Esta, menos pelo caráter efêmero e
intermitente que marca os movimentos populares, poderia ser dada pela forma anacrônica
de sua organização verticalizada, centralizada e antidemocrática, pretensamente
de vanguarda, mas que, longe de aglutinar e integrar os setores populares
afasta-os do processo de lutas, e toma o seu lugar, como razão iluminada, mas
que se revela insensível à demanda de participação que se registrou nos setores
populares urbanos nos anos 80 uma forma de organização que, apesar de superada
pela maioria dos movimentos recentes, ainda não foi de todo apagada da memória
nem da prática de muitos grupos e lideranças que se consideram os eleitos pela
história, com a "missão" de impor a todas as demais categorias e
classes o “único e real” projeto histórico de uma verdadeira democracia.
Assim considerando, indicar o
refluxo dos movimentos pela constatação de sua pouca visibilidade e fundado na
consideração de uma nova conjuntura política, marcada por uma nova forma da
luta de classes e lugar de conflito, assinalando a entrada em cena de novos
atores, como as ONGs, por exemplo, corresponde, apenas, ao registro descritivo,
perfeitamente plausível e congruente com aquilo que os movimentos nos legaram,
ou seja: novo espaço de interlocução público, o que não é nada pouco, volta a
dizer, pois é nesses espaços que se pode abrigar a pluralidade dos atores e
coletivamente construir a democracia.
Tentar desqualificar esse
processo de conquista de direitos e de uma noção de cidadania construída a
partir da ação coletiva, reduzindo o à evidência quantitativa dos movimentos, o
que faria supor, considerando sua menor visibilidade pública nos anos 90, o
fracasso de todo o processo anterior, corresponde a uma abordagem estéril,
deslocada no tempo e, talvez por isso mesmo, antidemocrática, antipolítica,
especialmente quando essa desqualificação ocorre para sair em defesa de um
marxismo que, certamente, o próprio Marx, cuja genialidade deve ser sempre
celebrada, ajudaria a enterrar. E aqui falo daquelas abordagens que ainda
celebram o Marx de A questão judaica, cuja crítica dos direitos
não abole apenas a ideia de
cidadania liberal, mas a própria dimensão simbólica da cidadania, como "ideia-força",
e, sem dúvida, também como história, conquistas que nos legaram os movimentos
sociais em mais de dois séculos de lutas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Paulo: Ática, 1991.
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set./dez. 1989.
Por Felipe Franco
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